Arquivos de sites

Regente Agrícola

A sátira de hoje é sobre a desilusão manifestada pelo regente agrícola que preside ao Eurogrupo, o indivíduo cujo impronunciável nome é Dijsselbloem. Rapaz católico nascido em terra protestante, é um tipo importante! Ele assim pensa. Preside ao encontro mensal e informal dos Ministros das Finanças dos países do euro, reunião à qual alguém teve a original ideia de atribuir um nome próprio, como se de uma instituição, que não é, se tratasse. Mensalmente, aqueles que gerem o destino financeiro dos países do euro reúnem sob o comando de um especialista em agricultura, mas não é por isso que lhes chamam nabos…

Após as tradicionais ameaças, desta feita sem sequer disfarçar a chantagem, afirmou que a submissão nacional o levaria a intervir de forma benevolente. A tirada aparentemente paternalista foi apenas mais uma manifestação de soberba. Por isso lhe inchou o ego. Mas a desilusão não se deveu apenas à vaidade, deveu-se sobretudo à sua inabalável ideologia, à sua profunda crença no modelo de negócio e de gestão da virtuosa Vereenigde Oostindische Compagnie, empreendimento que entre nós ficou conhecido como a Companhia Holandesa das Índias Orientais. Estudioso destas coisas da economia agrária, tem particular admiração pela condução do negócio das especiarias no inicio do sec XVII nas longínquas ilhas Molucas. A cultura que mais o fascina é a do Cravo-da-índia, daí recorrer a métodos semelhantes aos de então. Parece porém, que este valiosíssimo intelectual tem vindo a cavar a sua própria cova. Não é suposto haver espaço para veleidades dos nativos…

MestreAgricola

El Corralito

Por certo que o exemplo do incumprimento Argentino nos será servido em abundância nos próximos tempos. Contar-nos-ão as consequências de um fenómeno que ficou conhecido como “el corralito”, nomeadamente a contestação social, a indignação e a revolta das populações. As causas, essas, ficam na gaveta da sapiência dos comentadores da situação. Não são nem ideológicas, nem técnicas, embora quase tudo possa ser explicado dessa perspectiva, a questão central é a distribuição da riqueza. Sempre foi. Assim, em detrimento das consequências, abordarei as causas.

Recuemos até ao século XVI. Os territórios que hoje designamos por República da Argentina tinham então uma densidade populacional muito baixa. A fundação daquela que ainda hoje é a capital, foi apenas um de muitos equívocos, mas uma vez identificadas as fontes e os meios para a extracção de riqueza, foi refundada. Buenos Aires era o centro do poder económico e político do colonialismo espanhol na América do Sul. Por lá passava a prata de Potosí rumo à Europa. A economia local servia esse negócio: produzia essencialmente alimentos e animais para o trabalho naquelas tristemente famosas minas Bolivianas. As definições territoriais evoluíram. O Vice-Reino do Rio da Prata, as Províncias Unidas do Rio da Prata e a República da Argentina, todos partilharam a mesma capital. Dir-se-ia que a Argentina sempre foi “só” Buenos Aires, e que tudo o resto era Caudilhismo. A riqueza extraída viajava obviamente para a Europa. 

A densidade populacional manteve-se baixa até aos fluxos migratórios do século XIX. Com eles chegaram os ecos da revolução francesa. Os movimentos revolucionários visavam não só a independência da Coroa Espanhola, mas também de Buenos Aires. Nela residia a população de origem europeia, não mestiça, que controlava a produção de produtos alimentares, cuja exportação era o novo negócio. A prata tinha nova rota. As últimas décadas do século XIX foram de tal forma prósperas que Buenos Aires era então conhecida como a “Paris da América”, com as suas amplas avenidas e os seus edifícios de arquitectura Art Nouveau. A cidade era então o expoente máximo da cultura urbana da Belle Epóque. Tudo graças à produção agrícola. O resto do território continuou à mercê dos caudilhos, cada um dos quais mantinha o seu privilégio não atacando o privilégio da capital. Séculos de paz podre. Não obstante a assimétrica distribuição de rendimento, a Argentina era à entrada do século XX, e até às vésperas da primeira grande guerra mundial, um dos países mais ricos do mundo!

O mundo mudou no pós-guerra. De forma indirecta, a Terça-feira Negra precipitou o fim da prosperidade Argentina. O principal cliente e investidor, o Reino Unido, estava em dificuldades financeiras pois estava muito endividado junto do seu desejado aliado, os Estados Unidos da América. A sempre precária estabilidade Argentina foi posta em causa pela assinatura do polémico tratado Roca–Runciman, o qual prejudicou gravemente a balança comercial do país, com a agravante de a Argentina nunca ter desenvolvido um sector financeiro suficientemente forte para substituir o investimento externo. Os investidores locais procuraram sobretudo a renda, manipulando as instituições politicas e económicas por forma a obter riqueza sem a produzir. Uma sociedade até então exclusiva, tornou-se ainda mais assimétrica. O ambiente social que sempre fora tenso, tornou-se explosivo. A Argentina viveu assim um longo período de ditadura militar, por vezes alternada por breves momentos democráticos.

A neutralidade Argentina na primeira grande guerra, foi repetida na segunda. O caos social e económico manteve-se até o final desta. A instabilidade foi terreno fértil para o populismo, o qual apenas ocultou o ciclo vicioso. A economia formal continuou a garantir rendimento a um muito restrito segmento da sociedade. Tudo mudou, para que tudo permanecesse na mesma, igual ao que sempre foi desde os tempos do colonialismo Espanhol. A alternância entre governos democráticos e ditaduras militares manteve-se até final da década de oitenta. Foi no início da década seguinte que o governo argentino tomou uma decisão monetária decisiva, ao estabelecer a paridade do Peso argentino com o Dólar norte-americano. Na sempre especial Buenos Aires, o comércio passou a aceitar dólares e os cidadãos foram até encorajados a abrir contas nessa moeda. Parecia uma boa ideia, pois mesmo que o Peso argentino entrasse em colapso, os aforradores em dólares estariam garantidos. O consequente e instantâneo aumento do poder de compra de toda a população precipitou um significativo aumento do consumo de bens importados, proporcionou crescimento económico, mas agravou o desequilíbrio da balança comercial do país, pois a competitividade das exportações foi seriamente afectada. A paridade durou uma década. A riqueza criada por decreto tornou-se insustentável no final de 2001. Os titulares de contas em dólares foram primeiro restringidos nos montantes a movimentar e posteriormente obrigados a aceitar a taxa de câmbio entretanto estabelecida pela desvalorização do Peso. Na prática, o estado argentino apoderou-se de 75% da riqueza existente em dólares. Quem pagou a crise? Os pequenos aforradores, aqueles que não viveram acima das suas possibilidades. Os grandes “Armadores” de Buenos Aires e os caudilhos ficaram a salvo.

Toda e qualquer semelhança entre esta resenha da história económica da Argentina e a actualidade da Grécia será por isso pura alucinação. Apenas encontro um ponto de intercepção: A má influência grega sobre as boas práticas e procedimentos das companhias aéreas Argentinas. Devo contudo dar nota de um pequeno detalhe: A paridade com o Dólar foi decretada após um período de três anos de recessão, pelo mesmo partido que determinou o “el corralito” e que ainda hoje governa a República da Argentina, o Partido Justicialista (ou Peronista).

Felizmente que Portugal não está à mercê de nada disto, a menos que o dito popular “Portugal é Lisboa e o resto é paisagem” seja mais que um mito. Será? 

el-corralito-2001

Milho aos Pombos

Ele garante que lhe garantiram, ele surpreende-se com o que já sabe, ele fala quando nada tem a dizer e cala-se quando muito há por explicar. Atempadamente nos explica e avisa. Apela aos consensos em geral e à continuidade da paz podre em particular. É um legitimo porta-voz da subserviência ante os mercados. milho-ao-pombosCelebra os feitos nacionais e critica despudoradamente os inventores da democracia. Lá na sua azáfama consegue condecorar os seus, e borrifar-se para o galardoado com um Grammy. Ninguém fala nisso porque não só está no seu direito de preservar ódios de estimação, como (reconheço) é brilhante na gestão do tempo. Normalmente basta-lhe fingir de morto um mês. Compreendo, é o presidente da minoria que nele votou (aproveito para agradecer a quem se absteve).

Enfim, tanto que fica por relatar sobre o seu rasto. Juro que a cada dedicatória penso: é a ultima, já não há pachorra. Eu bem tento, mas hoje não contenho o ímpeto. Não é que o homem resolveu dar milho aos pombos? Já se sabe que quem o feio ama bonito lhe parece, mas há limites, ou pelo menos deveria haver. Saberá quão perigosas podem ser estas aves?

Quem gera mais postos de trabalho?

Em tenra idade injustiçado, foi discriminado entre laranjas. Alegadamente, o jovem não respeitara a bicha para a casa de banho da discoteca. O cavaquistão era então demasiado sombrio para quem tinha tanta ambição. Alistou-se como O Independente na trincheira contra tudo – Contra quem nunca se engana e raramente teve dúvidas, contra a Europa e não menos vezes contra a verdade. A mentira deu então alguma cor à indústria do entretimento nacional, dita imprensa. Foi giro.

Certo dia, apanhou boleia num táxi. Conduzia o Monteiro enquanto o jovem estudava itinerários alternativos (ainda não havia GPS). Eram do contra. Trocaram de eufemismo: o Centrismo deu lugar ao Populismo. Também foi giro. Contudo, não chegaram ao destino. A culpa? Do motorista. Despedido o condutor, avançou o timoneiro. Deixaram terra e fizeram-se ao mar. O jovem líder deu então largas à simpatia e à ternura. Partiu do Caldas e visitou todas as feiras, sem nunca esquecer a lavoura. O arraial foi tal, que nem demos conta que já não era do contra. Viva a Europa! Para melhor muda-se sempre, não é verdade?

Quem espera sempre alcança, e a oportunidade surgiu quando quem não sabia fazer contas fugiu do pântano. Fomos então brindados com quem não estava preparado para aquilo. O Jovem estreou-se então no sentido de Estado. Coube-lhe a pasta da Defesa Nacional. Comprou os Submarinos certos, da forma errada. Ter-se-á esquecido da manutenção. Como o país estava de tanga, poupa-se onde se pode, menos nas fotocopias. Chamado para outros voos, o primeiro de então é substituído pela vedeta que estava no banco. Ouviram-se depois os concertos para violino de Chopin. O Cenoura não gostou e pôs fim à festa. Ainda houve tempo para mais uma prova de apreço à lavoura – Lá se foram os sobreiros. Eram tempos da Santa dinastia. O jovem, que entretanto já não era, nem jovem, nem do contra, foi dar aulas. Enquanto esteve na terra dos bravos e na casa dos livres, deixou o Ribeiro ao Leme do bote até à mudança da maré.

Regressou na preia-mar e deu ao Ribeiro o destino do Monteiro, o esquecimento. À doutrina da lavoura acrescentou a protecção dos reformados e transformou o Caldas no ultimo bastião do contribuinte. Com convicções não se brinca! Esteve na primeira linha de todas as batalhas contra os desprotegidos. Cinéfilo confesso, fez os seus filmes com relativo sucesso. Vivíamos então acima das nossas possibilidades. Venha a ajuda. Chegada a dita, regressou coligado ao sentido de Estado. Abraçou a diplomacia económica, tarefa que justificou a ausência da ribalta domestica. Apesar do amor à lavoura, não partilhou o protagonismo tauromáquico. Acabada a faena do matador de touros, fez birra. Irrevogavelmente demissionário, foi promovido a vice e já desse posto anunciou a salvação da nação – a venda dourada de vistos. Tem jeito para publicidade.

Chegado o verão de 2014, enquanto outros foram de férias para o sotavento algarvio, ficou ao Leme do executivo. Tão obstinado estava com o bem-estar das populações, que em época de hipertensão a ministra das finanças não o conseguiu contactar. Evitou bem os danos colaterais. Consta que tem horror a seringas, pelo que também nada sabe sobre a injecção. Moral vertical mas ágil de convicções. Uma inteligência viva, um exímio gestor de crises. Foge como ninguém. Tem no dom da palavra uma arma justamente temida pelos adversários, sejam eles parceiros de coligação ou não. É brilhante!

Ontem, precisamente às 18h38, deu-nos um excelente ensinamento sobre como responder a uma questão desconfortável. Como é feio responder a uma pergunta com outra pergunta, responde com duas:

Quem gera mais postos de trabalho? A Remar ou a Bolsa de Excedentários?

o jovem

A aventura da Escócia

Na década de noventa do século passado, era eu miúdo, fui à Escócia. Deambulei pelo campo entre cidades. Não fui piegas. Em vez da praia no Algarve, procurei trabalho na apanha da fruta. Empreendedor, parti à descoberta de oportunidades. Não fui sozinho. Ao meu lado, dois irmãos que a vida me deu a escolher, i.e., amigos daqueles cuja empatia, cumplicidade e afecto se mantém até aos dias de hoje. Um longe nos fiordes, o outro perto, connosco a bordo da nau Portugal. Um abraço aos dois!

Falava-vos da Escócia rural, de aventuras que vivi e que nunca esqueci. Por lá apreciam a audácia, talvez por isso nos tenham acolhido com curiosidade e consideração. Recém-chegados a Blairgowrie, fomos desafiados a tentar um salto (supostamente muito perigoso) sobre as águas do rio Ericht. Fomos. Chegados ao local, o lendário Donald Cargill’s Leap, saltámos. Pareceu-me banal, mas no regresso percebi que todos os escoceses que saltaram depois de nós o tinham feito pela primeira vez. Até esse dia, o salto era um exclusivo do mentor da iniciativa, o bom do John-Paul. Naquela tarde, o clube exclusivo acolheu novos membros e tornou-se Luso Escocês. Na verdade, senti-me em casa.

Como nós, os escoceses são competitivos. Especialmente no desporto. Lembro-me de um aceso debate com um jovem amplamente tatuado que gritava “I’m a real Scott from Dundee”. Era uma ameaça. Debatíamos um lance de futebol, onde alegadamente eu lhe teria pontapeado a canela. Se lhe toquei foi sem querer, mas foi marcada falta. O resto do jogo foi durinho, mas leal. Marquei o único golo da minha fugaz carreira de jogador de futebol de 11. Safei-me sem mazelas. Ainda hoje acredito que o salto no Cargill’s Leap abonou a meu favor. Ah, o jovem escocês era um tudo nada menos jovem que eu, e também bastante menos pequeno. Este meu “amigo” rebelde tinha um comportamento curioso. Reparei que ele, tal como a maioria dos escoceses que comigo colhiam framboesa nos campos, curvava-se numa respeitosa vénia sempre que um determinado helicóptero nos sobrevoava a baixa altitude. A chefe da quinta, a maternal mas exigente Leena, explicou-nos que se tratava de nada mais nada menos que o helicóptero de sua majestade a Rainha Isabel segunda. Espantoso, pensei, têm a alma dividida. Como sabem que ela vai lá dentro, perguntei. A resposta foi esclarecedora: “Não sabemos”.

De Inverness a Edinburgh constatei a contradição entre o orgulho nacionalista e a veneração à Rainha. Connosco partilham os paradoxos das velhas nações – Orgulhosos mas resignados. Somos mesmo parecidos. Divergem e muito na expectativa que têm sobre a gestão dos dinheiros públicos. O bom do John-Paul deu-me sobre este tema uma lição que à data não percebi o alcance. Certa manhã, após partirmos da quinta em que trabalhávamos (propriedade de uma simpatiquíssima e nobre senhora inglesa, cujo nome e titulo nobiliárquico não me recordo), seguíamos de autocarro por uma estrada local, estreita e tortuosa, que não obstante não tinha um único buraco. Parecia uma pista! Comentávamos isto entre nós, em português. O espanto com que o fazíamos atraiu a atenção do nosso maior cúmplice local. Após tradução, a naturalidade e convicção com que John-Paul nos respondeu foi marcante. Peremptório disse “claro que não há buracos. Como pode haver buracos quando pagamos impostos para a manutenção das estradas?” Disse-nos tanto em tão poucas palavras. Na sua simplicidade rural, na sua resignada mas orgulhosa cidadania disse-nos o obvio. Após tantos anos, constato que por cá continuamos sem compreender algo tão simples: Pagamos IVA sobre imposto automóvel (dupla tributação); aproximadamente metade do que pagamos por cada litro de combustível é imposto; pagamos portagens ao atravessar pontes; pagamos portagens para circular em auto-estradas; pagamos imposto único de circulação (único!!); pagamos o estacionamento na via publica nas grandes cidades, e em breve pagaremos também portagem para nelas entrar. Sim, pagamos múltiplas (demasiadas) vezes para o mesmo fim, mas mesmo assim, não faltam buracos nas nossas estradas! Só me atormenta a nossa resignação perante tal contra-senso.

Na Escócia hoje, qualquer que seja o resultado do referendo, o orgulho e alma dos escoceses vão sair reforçados do processo. O resultado ditará a independência ou maior autonomia, nunca menos. O consenso é virtude britânica. O velho império sempre fez da hipocrisia uma arte. Em Londres, a tradição imperial não morre. Nota-se quando comparamos as criticas que tece à União Europeia com os argumentos que apresenta em prol da manutenção da Grã-Bretanha. Estou pela independência, quero que o mundo mude, mas se a Grã-Bretanha ainda existir amanhã, os Escoceses serão garantidamente mais autónomos.
Observemos os níveis de abstenção.

Bandeira da Escócia

O Monstro da Tasmânia

O desígnio da nação é o Mar. Ouvimos este pregão aos nossos governantes ao longo de décadas, mas não vemos nada. Cegueira nossa. Muito tem sido feito desde o início do sec XIX. Sim, são planos para futuro! O que fizemos? Importámos o monstro da Tasmânia. Desde então reproduz-se livremente no nosso país. Não há limites ao crescimento do seu habitat. O monstro da Tasmânia é aromático e pastoso. Cresce muito rapidamente, chegando aos 50 metros de altura em poucos anos. É perfeito para a construção naval e, imagine-se, é 100% à prova de fogo. Ao contrário das inflamáveis espécies autóctones, esta espécie nunca arde. Característica incomum que salvaguarda e protege os nossos soldados da paz. O monstro da Tasmânia é conhecido entre nós por Eucalipto, Eucalyptus Globulus para os mais eruditos.

tazmania

Somos a nação europeia com maior percentagem de eucalipto na sua floresta, e somos o país europeu com maior área de eucalipto em termos absolutos. Ninguém na Europa acarinha o monstro da Tasmânia como nós. Desertifica, destrói os solos, criticam. Nitidamente, os nossos parceiros não compreendem o potencial da espécie. O nexo de causalidade que escapa aos líderes europeus está apenas ao alcance dos nossos governantes: A Arábia Saudita é um deserto rico em petróleo, logo, quanto mais rápida a desertificação do país, melhor. É óbvio!

10157320_832860183407470_1836801799_n

Então e o mar? Está em marcha o plano: Após a concessão dos Estaleiro Navais de Viana do Castelo, o estado estará em condições de lançar o seu grande programa de construção naval. Abandonaremos as obsoletas técnicas de construção em aço para abraçar a modernidade. O futuro é a arquitectura naval Origami. Grandiosas frotas explorarão o potencial da nossa vasta zona económica exclusiva.

Voltar às bases – TV Rural

Recentemente deu-se o buzz TV Rural. O governo levou à discussão no parlamento a sugestão de recolocar na grelha um programa sobre a Agricultura e o Mar que tanto sucesso fez durante 3 décadas entre 1960 e 1990.

Oh a ironia! TV Rural, um programa saído de cena a meio do período do Cavaquismo que governou Portugal entre 1985 e 1995, agora ressuscitado pelos seus herdeiros políticos.

Pudera tudo o que esse senhor matou na altura poder ser assim recuperado de um momento para o outro… No seu tempo acreditava que Portugal se transformaria essencialmente num País prestador de serviços, sem necessidade de produção agrícola e industrial que prontamente desmantelou. Só não esperava que os prestadores de serviços algum dia tivessem de sair em massa de Portugal para poderem exercer a servitude humilde e honrosa no estrangeiro. Como adivinhar que a grande dependência da produção externa nos pudesse um dia fragilizar ao ponto de condicionar a tomada de decisões que afectam directamente a nossa soberania e o nosso Estado?

A oposição portuguesa por tradição é uma oposição do contra procurando sempre focar-se nos aspectos negativos de medidas tomadas pelo governo, mesmo quando aparentemente positivas. Vemos assim os partidos que defenderam as vantagens da manutenção de um canal de televisão pública, para salvaguardar um meio de comunicação que não possa ser instrumentalizado, condenar o uso de influência política para pôr no ar um programa, interferindo assim na normal gestão da RTP.

Ora é exactamente esta a vantagem de ter um canal público. O de contra a lógica comercial substituir uma potencial novela, reality show ou programas da socialite por um programa útil apesar de aparentemente pouco atractivo e com fome de audiências. Apoio e digo que o simples relançamento do TV Rural é pouco. No passado o TV Rural beneficiou do facto de não existirem canais concorrentes e os jovens que acordavam cedo para ver os cartoons matinais acabavam por aprender umas coisas de forma inconsciente enquanto esperavam e viam a única coisa disponível.

Como recolocar o TV Rural no horizonte de interesse dos Portugueses e ao mesmo tempo vincar a aposta nos sectores primários da economia? Simples. Tenham a coragem de colocar nos programas escolares projectos obrigatórios de produção de hortas caseiras. Não como um mero ATL mas como uma disciplina durante um ciclo escolar completo. Através dos jovens e entusiastas alunos ensinem os pais a ganhar maior autonomia alimentar e a aliviar o orçamento familiar produzindo parte da sua alimentação.

Desta forma a prazo teremos garantido que todos os Portugueses passaram ao longo da sua vida escolar por um período de formação em actividades agrícolas que cada um escolherá, ou não, desenvolver no futuro, seja a nível profissional, seja a nível doméstico.

Ensinemos os Portugueses a sujar as mãos,  preparando-os para o colapso do período de dominância do colarinho branco no nosso mercado de trabalho.

Borda d’Alegoria

Ausentei-me por uns tempos. Caminhei pelo Alentejo e desliguei de tudo o que são notícias. Ao segundo dia já não havia crise. Havia o pulsar de um país à medida das possibilidades sem queixumes. Sem o mediatismo do zum-zum constante que ecoa no abismo infernal, do qual nos abeiramos, rapidamente olhamos para os acontecimentos locais simplesmente como modos de vida. Vive-se o que se pode, como se pode, sem pensar no que poderia ou poderá. Como a velhota de 80s que à porta da mercearia disse que ia ao velório do compadre, não me lembra o nome, para ver o compadre, que também não me lembra o nome, porque, pasme-se, achava que o homem não ia durar muito mais e para o ano já não estava entre nós. Mas como pode ela estar tão confiante que estará entre nós!?

Voltei para a cidade. Ouvi o circo mediático mas já imune à sua anestesia. Que se foda, pá. Se não morrer hei-de sobreviver de alguma forma até ter de matar quem de direito se preciso fôr. Caia lá esta merda toda para ver se é tão mau como predizem os que não souberam ler o passado para salvaguardar o presente.

Capa do Almanaque Borda d'Água 2013

E eis que no meio da contínua tempestade e desgraça social, política e económica vislumbro um vendedor do Borda d’Água que tentava vender o almanaque a um pai com uma filha pequena, que o ignorou, e para quem ficou a olhar enquanto dizia: “Se faz favor, posso-lhe fazer uma pergunta? Se faz favor…” Predispus-me à sua frente como cliente. Olhou para mim atónito. Não me abordou. Disse-lhe eu que queria um, por favor. Desconfiado passou-mo para a mão. Passei-lhe os 2 € sem que me dirigisse a palavra. Quando me inclinei para seguir o meu caminho ganha coragem e pergunta-me se não lhe posso arranjar um emprego. Fez-me sentir desajeitado por não ser um patrão… apesar de ser verdade, ao contrário de algumas vezes em que digo sem remorsos não ter moeda. Respondi-lhe que trabalhava por conta de outrem e não podia dar empregos, nem conhecia quem os estivesse a dar. Senti-me estúpido.

Refugiei-me no Borda d’Água e olhando para a capa diria que até aqui temos um Sr. Dr., como que a dizer que estudou muito, com sapiência divina para prever com exactidão todos os acontecimentos naturais, astronómicos e meteorológicos com influência  sobre o nosso querido Portugal. (há 2013!)

Folheei-o e tem uma grande lacuna. Não fala nem uma única vez em relvas. Toda a gente sabe que Portugal tem o clima e condições apropriadas para a produção de relvas. Temos relvas específicas que se desenvolvem em terrenos onde se meta muita água e onde seja abundante o estrume e o lodo. Misturando-se esses elementos, num grande caldeirão, obtém-se a poção mágica que dá força e vigor a essas relvas. O pasto é imenso e pode sustentar muitos bois que a mantêm rente. Suficiente para se perceber que existe, insuficiente para estorvar as movimentações aleatórias e desorientadas dos líderes da manada. Depois de algum tempo de sustento os bois ficam bem nutridos e partem para os seus tachos respectivos. E as relvas crescem sem ninguém para as comer. Porque o meter água, o lodo e o estrume não param de jorrar. Chegando ao ponto em que passam o ponto de pasto e se tornam altas e vigorosas formando uma barreira viçosa e nebulosa. Nesse ponto quem dela cuidou já não se arrisca a cortá-las. Porque sabem perfeitamente que o que se esconde por debaixo será revelado se as relvas se forem.

Certamente que esta falha poderá ser corrigida nas próximas edições do almanaque. Já na contra-capa encontrei um texto que resumidamente diz que de 2013 não podemos esperar grandes melhoras. Excepto em duas linhas que nos relembram que a esperança deve sempre ser a última a morrer. Mais descansado no FDS, para descomprimir, fui cortar a relva.

Ser Europeu porque quero e não porque preciso

Um-dó-li-tá, a Grécia fica, a Grécia sai, Portugal logo se vê e quem fica ficará!

Por agora ninguém sabe muito bem e são tão corriqueiras as notícias contraditórias que ninguém quer saber. Que será, será. O projeto europeu era tão sólido que nem se lembraram de criar um guião para o abandono, ou mais concretamente para a expulsão, de um estado membro. O que acontece se um país sair da União Europeia? Nesse país, na União e nas relações entre ambos?

Aparentemente está tudo borrado. Um dos principais medos é a transição de moeda que provocará um impacto no país ‘desertor’ que ninguém consegue medir. O problema põe-se sobretudo a nível das exportações e importações. Se a moeda nacional fôr muito fraca em relação ao Euro o país não conseguirá manter o seu nível de importações actual. Se fôr muito forte os ainda estados membros não poderão manter o nível de importações de produtos fornecidos por ele. A curto-prazo será impossível dar resposta às necessárias transformações no export/import, a não ser que seja um cenário já previamente trabalhado em background. Para além da total reformulação da balança de importações e exportações haveria ainda a questão da gestão da dívida que não desapareceria como que por magia. Seria até mais complicado pois deixaria de haver tanto poder de influência política e de regime.

Este problema coloca-se sobretudo porque a União Europeia está alicerçada numa rede de interdependências em que vários países ‘destruiram’, a troco de subsídios, grande parte dos seus meios de produção em sectores de actividade específicos. Houve uma especialização e/ou quotização da produção nos vários estados membro para tentar criar uma economia fluída em que a necessidade e procura entre membros se complementasse. Mais do que as condições naturais locais era importante o cenário global para desenhar uma sustentabilidade mesmo que com medidas artificiais como subsídios de desincentivo à produção.

Agora, à beira da desagregação, há países em grande embrulhada porque a perspectiva de saída da União Europeia coloca-os numa posição de dependência externa de sectores basilares como a indústria e a produção alimentar. Se a torneira dos subsídios fechar perderam-se décadas de actividade. Máquinas, terras e população activa estão enferrujadas em muitos sectores precisando de anos para voltar a embalar. Num cenário de saída de um país ‘enfraquecido’ da União Europeia rapidamente as prateleiras dos supermercados ficariam vazias e com o motor da fome veríamos espectáculos como o da promoção dos 50% do Pingo Doce a acontecer nas despensas mais próxima.

Não me sinto confortável na coação para ser Europeu apenas porque o sistema está montado de forma a que se não o fôr terei de ser apenas um miserável e faminto Português. Cada país, cada região, cada localidade, deveria ter ao menos a capacidade de produção de alimentos que os tornassem relativamente independentes ao nível alimentar. Desta forma a política seria mais ideológica do que propriamente de subsistência como está a ocorrer hoje. E produzir é empregar.

Todas as projeções de futuro apontam para o continuar do aumento dos preços dos alimentos o que representa um esforço cada vez maior para garantir os níveis de importação actuais. Se há coisa com que não se deve brincar é com comida. E aparentemente há algo a assustar o governo ao ponto de querer apressadamente recuperar as profissões pertencentes aos sectores primários da economia e o amanhar das terras.

Será a temível porta aberta com uma luz ao fundo do túnel que diz EXIT?