Caça ao guito
“Temos de perder a vergonha de ir buscar a quem está a acumular dinheiro” terá sido porventura uma das frases mais infelizes da politiquice recente. A sua autora entretanto já deu mil e uma explicações que procuram aliviar o peso da literalidade desta frase, no entanto, em seu redor, orbitam outros pequenos acontecimentos que só podem deixar inquietos estes privilegiados acumuladores.
- O fisco terá acesso às contas com mais de 50 mil € (não há perigo, é só para fazer umas análises de dados);
- Está em estudo aplicação de nova taxa sobre património acima de valor a definir e vários ponderadores do IMI foram alterados para agravar este imposto sobre casas melhor situadas ou com melhores condições (boa casa só para quem pode);
O argumentos populistas mais utilizados pela esquerda são dois. Um é o de que o leque de contribuintes nestes segmentos é reduzido e tem de contribuir mais porque, hipoteticamente, se consegue acumular tanta riqueza deve-o a algum tipo de exploração (do sistema fiscal, da lei ou de pessoas). O outro é que com a nova receita se poderá por exemplo aumentar 5 € a todas as pensões abaixo de 500 €.
Estas medidas não são mais do que demonstração de fragilidades governamentais que resultam no explorar do elo mais fraco. Preferem rotular todos os acumuladores de riqueza como suspeitos a penalizar (porque em teoria lhes custará menos) ao invés de criar medidas, futuras ou mesmo retro-activas, que consigam acabar com a riqueza indevidamente acumulada por aqueles que verdadeiramente ludibriam o sistema, ou ter a coragem de cessar ou diminuir certas coutadas fiscais sobre quem explora o mercado português.
Mais, com este tipo de discurso e acção, cultiva na sociedade um confronto de classes, em que quem está longe dos patamares falados diz um “Apoiado!” com a convicção de que se o têm é porque são uns porcos capitalistas, no outro lado milhares dos abrangidos pelo estatudo de “acumulador de riqueza” sentem-se insultados por cumprir com as suas obrigações fiscais e ainda virem a ser penalizados por ter tido um comportamento de poupança mesmo no tempo de bonança.
Se existe tão grande clivagem entre determinados segmentos da população a culpa não será maioritariamente dos que estão em melhor situação mas sim dos que legislam e gerem orçamentos por forma a criar as condições laborais e sociais que conduzem à desigualdade.
Todo o princípio de caça à receita através da penalização dos mais abastados, que já cumprem um regime fiscal progressivo, torna-se ridículo a partir de certo ponto. E o argumento da distribuição da riqueza não pega, faria muito mais sentido que ao invés de se proporem a aumentar 5 € em todas as pensões até 500 €, pelo mesmo custo aumentassem 12 € em todas as pensões até 200 € e que concentrassem futuros aumentos de pensões apenas em escalões inferiores para que estes beneficiários abandonem a precariedade mais rapidamente.
Por fim recomendo também que no exercício da caça ao guito a esquerda se foque também naquela que é pretensamente a sua especialidade, a solidariedade social, sim porque para além da acumulação também a distribuição/desperdício de riqueza acumulada por outros (mais de mil milhões de € por ano para as IPSS) deve ser alvo de escrutínio apertado e quiçá seu redireccionamento para outros pontos de maior controlo e eficácia no combate pela igualdade.
A justiça e equidade social também deve ser exercida na governação, sem penalizar em demasia certos grupos a favor de outros, nem que apenas por princípio. Impeça-se o enriquecimento ‘sujo’ mas respeite-se o enriquecimento ‘limpo’ que já é devidamente taxado quando gerado e gasto. Caso contrário iremos caminhar num progressivo nivelar por baixo, em que quem está num percentil acima da média seja sempre visto como a próxima presa a abater para alimentar aqueles que, por desgoverno do país, desesperam e proliferam no limiar da pobreza.
Posted on Setembro 27, 2016, in Ideias para o País, Mentalidade Tuga and tagged Economia, Impostos, IPSS, Politica, Roubalheira. Bookmark the permalink. Deixe um comentário.
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