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Fenómenos Ambientais à Portuguesa

Que refrescante ver a nossa juventude a mobilizar-se para exigir que o governo faça mais pela prevenção/reversão das alterações climáticas.

Portugal está mesmo a precisar de alguma orientação neste sentido. Recentemente tivemos a novela da prospecção de petróleo finda por um movimento cívico. Um ministro vem a público preconizar o fim do diesel, o que parece ser uma boa notícia não fosse o facto de o futuro eléctrico necessitar de muuuuito lítio, que, por acaso do destino, é um mineral em que Portugal é riquíssimo! Claro que a mineração de lítio implica severa destruição ambiental mas alguém tem de pagar o preço ambiental para receber o melhor retorno económico e contribuir para um mundo mais verde, pelo menos até à era da mineração de asteróides ou outros astros.

Talvez nos pudessemos inspirar na China para a abertura de horizontes futuros. Com pragmatismo medidas assentes em estudos científicos impulsionam uma drástica mudança dos hábitos alimentares dos seus habitantes, para o seu bem e o do ambiente. Inclusive criam leis que penalizam a indústria agro-pecuária identificada como uma das principais causas de poluição.

E é aqui que vemos que o nosso Governo não dorme, mais uma vez analisando esta situação age aproveitando a oportunidade. Como? Simples, tornando-se uma enorme fábrica de produção de carne do mercado chinês. Serão mais de meio milhão de suínos a juntar-se às centenas de milhares de animais de outras espécie que se exportam anualmente. Passemos à frente do tema crueldade animal, do que passam esses animais portugueses nas viagens, do que os espera nos países de destino, o foco aqui é o tema ambiental e mais uma vez estamos disponíveis para emitir o CO2 que os outros não querem ou não podem emitir, esgotar os nossos recursos hídricos, desolar os nossos solos e poluir os nossos aquíferos para obter retorno capitalista ou crescimento de dois dígitos na exportação. Somos tão prestáveis que até assobiamos para o lado enquanto esvaziam a nossa biodiversidade desde que para um bom parceiro económico, para corte nos custos de produção agrícola ou para deleite gastronómico local.

Estes temas infelizmente não se estudam, não estão nos cardápios da nossa restauração, é preciso escavar, dedicar-lhe algum tempo para perceber que além das demandas aos organismos governamentais também existem transformações do foro pessoal que podem acelerar todo o processo de melhoria ambiental pois a chave de tudo é o consumo, quiçá, nos dias de hoje, com um poder de transformação global ainda maior do que o do voto.

Aguardo com serenidade a vossa força e sapiência jovens, que não seja mais uma trend, hype, flashmob, para preencher umas insta-stories à maneira porque Portugal, a Terra, precisam de uma mudança consistente e não apenas de mais um dia viral que o Governo e feed das redes sociais consigam rapidamente dissipar.

Sejamos o acelerador da mudança que exigimos aos governantes!

Portugal eco-friendly ou eco-fucker?

Um estudo recente  aponta para um futuro de secas extremas na península ibérica, que poderá conduzir à fricção na gestão de recursos hídricos partilhados por Portugal e Espanha. Será antecipado o catastrófico cenário de conflitos geopolíticos por disputa de recursos vitais como a água? O passado recente não tem sido abonatório para Portugal, com Espanha a colocar os seus interesses muito à frente dos nossos.

O que pode fazer Portugal? O que está ao seu alcance. Ser ética e ecologicamente exemplar para que não tenha telhados de vidro na altura de ‘atacar’ diplomaticamente a inaceitável posição do país vizinho. Se é a água um recurso partilhado sem o qual não poderemos viver, se o cenário projectado não é promissor, faz todo o sentido que ataquemos o problema analisando como gastamos água, acelerando a inevitável alteração dos hábitos de produção e de consumo rumo a um país inatacável em matéria de eco-sustentabilidade.

Portugal deve ponderar se a longo prazo será vantajoso promover actividades lúdicas sugadoras vorazes de recursos hídricos, se é inteligente manter uma gestão florestal indiferente aos volumes de consumos de água directo e indirecto (via combate a incêndios), se deve continuar a tolerar altos níveis de poluição, se faz sentido manter em marcha lenta a evolução do nível de eficiência energética nacional, bem como se não chegou a altura de redefinir a política de (des)incentivos à produção agrícola procurando promover a produção sustentável de alimentos saudáveis.

Para demonstrar ao mundo o seu empenho no combate à emissão de CO2, principal motor das alterações climáticas, Portugal deveria também acelerar a sua transição para uma economia o mais verde e circular possível. Até porque além da seca outro dos efeitos das alterações climáticas será a subida considerável do nível do mar. Situação que afectará Portugal em toda a sua costa, no que será uma enorme machadada no tão importante turismo.

E aqui surgem eventos contraditórios. Não há muito tempo foi travada, e bem, uma aventura petrolífera Algarvia, do nada surge agora uma acelerada aventura Alentejana. Ambas são ameaça ambiental idêntica em zona geográfica distinta, apenas com rentabilidade garantida para corporações, com vantagens duvidosas para a nação. O anular de apenas uma delas levanta a questão se o motivo terá realmente sido a defesa dos interesses de Portugal ou simplesmente o facto de ter execução entregue a corporações que não estão nas boas graças da governação.

Seja como fôr estamos num momento decisivo. A posição que Portugal assumir neste momento definirá não só o seu retrato ambiental como também a sua margem diplomática para negociações sobre recursos naturais partilhados. Portugal terá de escolher se se quer assumir como um admirável percursor de novas estratégias de eco-desenvolvimento, disposto a dar o tudo por tudo para arrepiar caminho, adiar ao máximo a chegada de grandes tormentas, ou se quer, de forma camuflada, limitar-se a reagir aos problemas vindouros, explorando ao máximo o sistema económico vigente, esgotando de forma predatória os seus próprios recursos naturais a qualquer custo, impulsionando uma economia extractiva global altamente poluidora, apenas para garantir um presente política, social e economicamente confortável.

Até ver parecemos caminhar rumo ao segundo cenário, enrolados numa emaranhada teia político-corporativa pouco preocupada com os sacrifícios e hipotecas irrecuperáveis a realizar para garantir lucros chorudos.

Espero que ainda vamos a tempo de acordar para estes temas, que venhamos a ser tão vigorosos a expressar a revolta face a este rumo como o fazem muitos dos estrangeiros radicados em terras Algarvias e Alentejanas. Parece que mesmo não sendo de cá sabem melhor do que nós compreender a projectada finitude dos nossos delicados tesouros naturais.

nao-petroleo

Das Auto…

Conduzi um automóvel pela primeira vez em 1983. Já lá vão mais de trinta anos, mas lembro-me como se fosse hoje. Recordo-me até do padrão do forro da almofada que o meu avô materno me colocava nas costas, pois de outra forma não chegava aos pedais. Com saudade e muita ternura aqui relato essas tardes bem passadas, num antigo campo de treino da Carris que então existia na margem direita do rio Tejo, precisamente onde hoje estão os pilares da ponte Vasco da Gama. Foi um segredo que guardamos a três durante largos meses. O terceiro cúmplice era um Carocha 1200, Branco-Frigorífico, 100% alemão, construído na fábrica de Wolfsburg em 1959. Ostentava o brasão da cidade que o viu nascer, símbolo que a par do logótipo do fabricante, faz parte do meu universo dos afectos. Era “muito” potente, 36 cv imagine-se! Suportou toda a minha falta de perícia. Dele era a única matrícula que até hoje memorizei: LC-57-47. À época não me preocupava por ai além com o ambiente. As preocupações ambientais de então estavam relacionadas com o civismo básico. Bastava colocar o lixo nos locais apropriados. Não se falava de aquecimento global e muito menos de pegada ecológica.

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Este relato prévio explica porque motivo sou suspeito para comentar a questão da viciação dos testes de emissões poluentes por parte da Volkswagen. Sinto-me até tentado a desenvolver uma coerente teoria da conspiração, talvez envolvendo engenheiros de nacionalidade grega ou lusitana. Os primeiros são famosos pela tendência para a adulteração de números e os segundos pela tendência para a pieguice e para o ócio. Mas mais importante que identificar culpados, talvez seja mais útil compreender as dinâmicas. Uma boa teoria da conspiração deve abraçar um espectro mais amplo, ter uma maior profundidade de campo. Resumido, é sabotagem. Houve sabotagem, não dos resultados, mas sim do segredo que até então foi mantido sobre a viciação dos testes. Todos os fabricantes o fazem. Será uma questão de semanas até que tal seja um facto comprovado. Julgo que o ataque não é a um fabricante em concreto, mas sim a um combustível, o gasóleo. Talvez seja até um contra-ataque da gasolina.

O “meu” adorável Carocha, poluía e envenenava porque usava gasolina com chumbo (essa extraordinária invenção de Thomas Midgley que entre outras “coisas boas” inventou os CFCs). Muito embora os efeitos do envenenamento com chumbo sejam conhecidos desde (pelo menos) o inicio do século XX, a gasolina sem chumbo só foi banida da sofisticada Europa no ano 2000. O cosmopolita estado Português fê-lo no ano anterior, 1999. A maior economia do mundo, os Estados Unidos da América, baniu o uso da gasolina com chumbo em 1996, muito embora os primeiros alertas para o risco de plumbismo tenham ocorrido mais de setenta anos antes. Bem vistas as coisas, estamos a melhorar e muito. As denúncias que outrora demoravam décadas a surtir efeito, têm hoje impacto ao fim de apenas alguns meses. São os mercados a operar livremente, os reguladores a regular e os consumidores a consumir, tudo é esclarecido e ninguém é enganado…